Chaminé Giuseppe Pellegrini – Pico Menor de Friburgo (± 2.350m)

Aconteceu tudo muito rápido. Na verdade não esperava fazer esta maravilhosa escalada (na realidade nem imaginava). Então recebo um telefonema do Sr. Francesco Castagnaro (Playboy), para informar que ele iria para Salinas, chegando na sexta-feira e que eu reservasse o seu lugar no Mascarin (República Três Picos). Completando, me convidou para fazer a Chaminé Pellegrini.

Na hora topei, mas sem muita noção do que se tratava, e na condição dele guiar, afinal não tinha ideia da escalada. Mas me conheço bem e sei que partindo do Play, não guiaria nada que ele me convidasse. Na realidade ele adorou saber que guiaria tudo. Logo em seguida liguei pro Flavinho, pois ele estava querendo fazer a leste comigo e eu não tinha confirmado nada com ele ainda, então marquei a leste com o Flavio na quinta, descanso na sexta e no sábado escalaria com o Play.

Fui para a internet atrás do croqui da via e imprimi os dois disponíveis no site da FEMERJ. Chegando em casa comparei com o croqui do guia de Salinas e, para minha surpresa, as graduações eram bem diferentes: no croqui original 5º IIIsup A1 – até então estava tranqüilo; no livro, 6º VI A1 E3 D4, aí já fiquei preocupado. Mas, como era o Play que iria guiar, então estava tranqüilo também.

Na quarta à tarde parti para Salinas, chegando na República Três Picos por volta das 20h30. Eu e Flavio separamos o material para escalar no dia seguinte, com alvorada marcada para às 05h30 e saída às 06h. Resumindo, saímos às 06h10. Chegamos na base às 07h10; na primeira chaminé às 08h45; no cume às 13h50 e no Mascarin às 17h. Rapelando pela Sylvio Mendes em duas horas. Vale lembrar que o Flavio não pisava naquele cume havia mais de quinze anos. Nossa primeira Leste foi em março de 1996. Parabéns velhinho.

Bom, na sexta o dia era de descanso, afinal no sábado tinha me comprometido com o Play. Então fui para a Cabeça do Dragão com a Ana Clara, Irini, Flavinho, Schmidt, Bacellar, Julia e Mascarin. Também nos acompanhou uma família de Jundiaí-SP (Giba, sua esposa Mª Pia, seus dois filhos Caio, com a namorada Fernanda e Lucas – uma mão na roda este moleque aparecer por lá, da idade da Ana Clara).

Retornamos ao refúgio e, no fundo, no fundo, até aquele momento ainda não acreditava que o Play aparecesse. Mas não é que o cara chegou no finalzinho do dia! Tomamos umas cervejas e separamos o material. Neste momento o Boris se empolgou, mas desistiu logo quando soube que a alvorada estava marcada para as 05h30. Na realidade, se eu soubesse do perrengue teria marcado para as 04h30.

Acordamos como planejado, tomamos café e partimos para a escalada. Eu já tinha feito a caminhada do Pico Menor, ou seja, o retorno estava garantido seja qual fosse a hora que atingíssemos o cume, o que valeu também para achar a base, ou quase.

Pensamos em deixar algum material na base, para subir apenas com uma mochila. A única coisa que poderíamos deixar eram os calçados, pois todo o restante poderíamos precisar em algum momento. Então resolvemos levar tudo, já que a descida era pela caminhada e nenhum do dois queria caminhar com bota de escalada.

Arrumamos-nos e o Play começou a guiar. Vai para um lado, vai para o outro, roda pra lá, roda pra cá, acho que é por aqui, pode ser por ali, este negócio tá esquisito, não vejo nada, enfim ele toma a decisão de tocar por ali mesmo.

Ele subiu e me puxou após ter esticado aproximadamente 50m de corda, quando cheguei até ele comentei: “Cara se for tudo assim estou fora, vamos descer”. Então constatamos que tínhamos errado a base e feito o primeiro esticão da via Lacas Loucas, o que nos deixou um pouco mais tranqüilos, pois daquele ponto avistávamos a chaminé e a possibilidade de rapelar até ela. Foi o que fizemos. Subimos mais uns 30m e rapelamos até a chaminé. No fundo foi o melhor que aconteceu, pois o início da chaminé é muito sujo, muito mato.

Tocamos pra cima até o final da chaminé estreita, e neste momento começamos a concluir algumas coisas, tais como:

– Não era nada bom ficar rebocando as mochilas, mesmo rebocando as duas ao mesmo tempo, perdíamos muito tempo;

– Começamos a perceber que os croquis da via, apesar de bem desenhados, não retratavam bem a realidade, ou as coisas mudaram por ali, pois onde era pra ter grampo não tinha. Por vezes dava pra proteger em blocos de pedra entalados;

– Começávamos a imaginar porque o Sergio Tartari havia comentado que nunca mais voltaria naquela via.

Toca pra cima. Até chegar ao tal “platô de bambu”, é muita pedra, muita chaminé, tem umas passagens muito esquisitas/sinistras e o caminho não é muito óbvio. No meio da chaminé média encontramos uma fita e um prussik bem velhos num bloco de pedra entalado e aí dois pensamentos surgiram: ou estamos no caminho certo ou alguém utilizou isso para rapelar e sumir daqui. Olhávamos para cima e tentávamos, decidir para que lado ir. Resolvemos obedecer a lógica do croqui que caía ligeiramente para a esquerda e que aparentemente o Play achava mais tranqüilo, pois no final tinha um bloco de pedras onde ele podia se prender (o outro lado visualmente não tinha nada). Foi a decisão acertada. Logo após algumas passadas horizontais sobre abismo e trepa pedras, ao ponto de acharmos que já tínhamos passado pelo platô de bambu, o Play grita: “Aqui é o platô de bambu”. Então pensei: “Carai, f…. Vamos chegar ao cume à noite, falta coisa pra carai”.

Toca pra cima, ou melhor, pro lado. Encaramos uns 45m de horizontal, e quando cheguei até o Play, toquei até o próximo grampo que estava há quase 15m, ou seja, total de 60m de horizontal. Tá maluco!!! Tudo bem! Nem era tão difícil, mas naquela altura do campeonato… Fala sério.

Toca pra cima. Agora por uma artificial de grampos, chapas de ferro e parafusos, uns 40m de artificial. Neste momento coloquei o anoraque e deixei a lanterna à mão. Quando chegou minha vez de subir, já estava escuro e fiz a artificial com lanterna. Estava me sentindo bem e cheguei bem rápido até o Play, que falou: “Cara, vamos achar esta fissura de 6º e sair fora daqui”. Dei uns três passos e quando olhei pra cima dei de cara com a fissura, que podia ser feita em artificial. Como me sentia bem, falei: “Play, vou tocar aqui, assim economizamos o tempo de passar toda a corda”. Sim, pois como o play guiou 99% da escalada, sempre que eu chegava até ele, tratava de passar a corda, pois tudo que não queríamos era perder tempo desembolando corda.

Toca pra cima. Após a artificial cheguei ao “platô da alegria” que não podia ter um nome melhor. Que felicidade em avistar o cume! Perdemos alguns segundos apreciando o visual com as lanternas desligadas, e o Play tocou um pequeno trecho de trepa mato até o cume, aonde chegamos por volta das 19h15.

Agora! Toca pra baixo! Não perdemos tempo no cume, descemos logo até um bloco de pedra que dá acesso ao cume pela caminhada, arrumamos as mochilas e iniciamos a caminhada de volta. Por volta das 20h45 estávamos chegando à República Três Picos, cansados, mas muito felizes.

Cervejinha para comemorar que ninguém é de ferro, um bom banho quente e jantar. Dia perfeito!

Fica registrado o meu agradecimento ao Playboy por mais esta aventura. Valeu Play, até a próxima! Por favor, que não seja chaminé.

Ivan Azevedo

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